SOLENIDADE DO NATAL DO SENHOR 2012 - SÉ NOVA DE COIMBRA - MISSA DA NOITE

A noite de natal constitui a celebração da fé na encarnação de Jesus, o Filho de Deus, expressa no Credo, quando diz: “E encarnou pelo Espírito Santo, no seio da Virgem Maria e Se fez homem”.

Esta formulação da Igreja condensa em si as afirmações bíblicas variadas na sua linguagem, mas sempre convergentes na apresentação do mistério da vinda de Deus ao nosso mundo.

No texto do Evangelho ouvíamos algumas dessas frases densas de teologia e escritas pela comunidade cristã que acreditou em Jesus, como o Filho de Deus. Uma expressão sublinha a dimensão humana e natural de Jesus, perfeito homem: “Enquanto ali se encontravam, chegou o dia de ela (Maria, que estava para ser mãe) dar à luz e teve o seu Filho primogénito”.

Outra expressão sublinha a afirmação central da fé, segundo a qual esse Jesus, o filho de Maria, é o Salvador e o Cristo Senhor, perfeito Deus: “nasceu-vos hoje, na cidade de David, um Salvador, que é Cristo Senhor”. Como sabemos, a expressão Cristo Senhor, aqui usada pelo evangelista, encerra em si a realidade e o significado teológico da pessoa de Jesus. Depois, em todo o evangelho da infância de Lucas alternam elementos alusivos à humanidade de Jesus com outros alusivos à sua divindade, que suportam a afirmação central da fé, segundo qual Jesus é verdadeiro Deus e verdadeiro Homem.

Na leitura do Livro de Isaías, afirma-se a esperança da humanidade na vinda de um Salvador, acalentada durante séculos. A ânsia de paz e de justiça no coração e na vida de cada pessoa e da humanidade, foi e é uma constante em todos os tempos. Sempre se sentiu que a paz e a justiça são fruto do trabalho, da vontade e da ação humana, mas, sempre se viram os seus limites, que são os limites da fraqueza que nos caracteriza.

À luz da fé judaica, fé revelada, sempre se acreditou que paz e justiça só podem ser alcançadas quando nos abrimos a Deus como Aquele que potencia as nossas capacidades e forças. Isaías concentra nas suas profecias esse sentir comum de todo um povo eleito, que espera no Menino que nasceu para nós e no filho que nos foi dado, como Aquele que realiza as promessas de Deus e satisfaz esses anseios do coração humano.

O Natal é, por isso, parte integrante do mistério de Jesus Cristo, que se fez homem, anunciou a Boa Nova do Reino, padeceu e foi sepultado, ressuscitou ao terceiro dia, cumprindo o que fora anunciado pelas Escrituras. Não é possível desligar uma realidade da outra, nem desligar o mistério do natal de Cristo, Deus e Homem verdadeiro como afirma o Credo da fé cristã.

No mundo em que estamos é grande a dificuldade que enfrentam os que perderam o sentido profundo da sua fé, porque se sentem vazios nas suas razões para celebrar o Natal. Por vezes, mesmo entre os cristãos e os filhos da Igreja se gerou a confusão, fruto da ignorância ou da intromissão dos modelos de celebração desenvolvidos pela cultura hodierna marcadamente laica e mercantilista.

Em nome da verdade da história só temos um caminho: centrarmo-nos no Natal da fé e na mensagem da revelação cristã que é portadora do seu autêntico espírito. O Ano da Fé que estamos a viver, oferece aos cristãos uma nova oportunidade para realizarem essa tarefa urgente de entrarem em profundidade no mistério de Cristo, que é o mistério da fé, e que dá conteúdo e sentido ao natal.

Os cristãos deixaram-se submergir pela cultura ambiente e perderam em grande parte a capacidade de ser sal, fermento e luz do mundo, como mostra a introdução e assimilação de tradições contrárias à mensagem, à fé e aos costumes nascidos do Evangelho. Os artigos da Profissão de Fé, constantemente repetida, tornaram-se letra morta; as celebrações ficaram desprovidas de espírito e conteúdo; a vida deixou de espelhar convicções e compromissos; como nos recorda o Papa na Porta Fidei, tomou-se a fé como um dado adquirido e desistiu-se de fazer caminho.

O desafio que temos hoje é grande e empenhativo: voltar à fé professada e bem sedimentada pelo estudo, à fé rezada e celebrada com alma, à fé vivida como compromisso transformador da nossa vida. Enquanto cristãos não podemos ficar pelas análises que fazemos da sociedade numa perspetiva mais otimista ou mais pessimista, mas somos convidados a incarnar a fé. Estamos no tempo do testemunho corajoso, que arrasta e que seduz, qual contributo que devemos dar, unidos a Cristo Senhor, para a salvação do mundo.

Hoje, os cristãos são chamados a ultrapassar o natal dos poetas e do romantismo, cheio de encantos e frases belas e feitas, pois a realidade é mais dura do que aí se exprime. O natal da fé é exigente para nós como foi para Maria, a Mãe a quem uma espada de dor trespassou a alma; como foi para José no meio das humilhações e das incertezas do futuro; como foi para Jesus que assume toda a dor humana e une o presépio do abandono à cruz da dor e da redenção.

O natal da fé é duro e exigente porque implica dar o passo da incredulidade dos homens à humilde confiança em Deus; porque significa esquecer-se de si para considerar os outros no mundo da concorrência, da luta pelo poder, do domínio do capital e das vitórias ideológicas, políticas e religiosas; o natal é exigente porque obriga ao respeito pela vida, ao amor como base da união familiar, à moralidade na economia e no trabalho, à prática da justiça nas relações sociais e pessoais; o natal é exigente porque impõe a partilha dos bens materiais e espirituais com os irmãos desprovidos de uns e outros.

Nesta noite santa de natal, acolhamos a graça de Deus, fonte de salvação para todos os homens, de que falava a segunda leitura, e que não é mais do que o Jesus do presépio. Aprendamos d’Ele a renunciar à impiedade e aos desejos mundanos, para viver na justiça e na piedade, com um coração purificado.

Professemos, com alegria, a fé no Verbo de Deus Encarnado e comprometamo-nos a vivê-la e a comunicá-la com entusiasmo, sob a proteção de Maria. Ámen.

 

Coimbra, 24 de dezembro de 2012

Virgílio do Nascimento Antunes

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