SAGRADA FAMÍLIA DE JESUS, MARIA E JOSÉ
SÉ NOVA - 2024
ABERTURA DO JUBILEU “PEREGRINOS DA ESPERANÇA”
“Peregrinos da esperança”. É o tema deste ano jubilar, num tempo especialmente carente da esperança humana e da esperança da fé, num tempo, por isso, profundamente necessitado da esperança maior, capaz de suportar a humanidade nos seus desencantos, falências e medos, mas também de fortalecer a sua alegria, a sua confiança e o seu futuro.
O Papa Francisco inaugurou o Ano Jubilar na celebração do Natal do Senhor e pediu a todas as dioceses do mundo que o abrissem na Festa da Sagrada Família. Dois momentos significativos: o Natal a dar o sentido da esperança fundada em Jesus Cristo, o Filho de Deus que peregrina connosco; a Sagrada Família, imagem de todas as famílias e de toda a humanidade, que anda à procura e que encontra em Jesus Menino a luz para o seu caminho de peregrina.
O Ano Santo é um ano de peregrinação. Ele pretende avivar em nós a certeza da fé em Deus, que vem ao nosso encontro como peregrino que procura a humanidade por meio de Jesus Cristo, Seu Filho. A Encarnação do Verbo de Deus é caminho de Deus em direção a nós e a sua vida na terra é uma contínua peregrinação com os homens: nos caminhos da Palestina, quando vai ao encontro de todos os que estão sedentos de Deus, de amor, de saúde, de misericórdia e de perdão; na Paixão, quando caminha para a cruz levando consigo todas as nossas dores e se oferece ao Pai para nossa salvação. A peregrinação de Jesus Ressuscitado continua pelos caminhos do nosso mundo como anúncio de libertação: de Jerusalém donde sai com os discípulos de Emaús e depois, com a Igreja que proclama a feliz notícia até aos confins da terra.
O Ano Santo é um ano da nossa peregrinação pelos caminhos jubilares, em momentos significativos de celebração, que devem manifestar a nossa procura de Deus em resposta à iniciativa d’Aquele que se pôs a caminho para vir ao nosso encontro. É esse encontro, fruto da peregrinação de Deus e da nossa peregrinação, que é portador da esperança, da esperança que não engana, outrora proclamada pelo Apóstolo Paulo e agora proposta pela Igreja como graça do Jubileu. A nossa vida é peregrinação, porque o encontro com Deus está sempre a concretizar-se e propõe-nos sempre progredir na fé, na entrega da nossa vida, no amor aos irmãos, na comunhão da Igreja, na ação de graças ao Pai. A nossa vida é peregrinação porque a vida em Cristo é um percurso em profundidade; porque não temos aqui morada permanente e buscamos a Pátria Celeste para a qual fomos criados.
“Pôr-se a caminho é típico de quem anda à procura do sentido da vida”, diz-nos o Papa na Bula do Jubileu. Ponhamo-nos, por isso, a caminho como peregrinos, confiados em Deus que nos revela o sentido da vida e da esperança que não engana.
A Segunda Leitura de hoje, tirada da Epístola de São Paulo aos Colossenses, oferece-nos as três palavras fundamentais do nosso caminho jubilar: misericórdia, perdão e caridade. São os desafios que Deus nos faz em todos os tempos e que devem constituir o nosso programa deste Jubileu.
“Revesti-vos de sentimentos de misericórdia”. O Ano Jubilar na Sagrada Escritura constituiu sempre uma manifestação da misericórdia de Deus para com o Seu Povo e toda a humanidade. Ele está atento a todos os nossos passos e sofre com as nossas dores até à loucura da cruz, que se realiza na oferta da vida de Jesus por mim, por nós e por todos.
Reconhecer a misericórdia de Deus é o primeiro caminho para a gratidão, para o louvor e para a fé, que nos anima. Somos pobres e fracos, somos pecadores e nada podemos sem a sua bondade, que se manifesta em gestos libertadores, que dão novo sentido à nossa peregrinação. Deixemos que a misericórdia de Deus nos reconstrua por dentro e disponhamo-nos a percorrer o caminho da fé agradecida por tão grande dom.
“Perdoai-vos mutuamente se alguém tiver razão de queixa contra outro. Tal como o Senhor vos perdoou, assim deveis fazer vós também”. A consciência do pecado pessoal e comunitário faz parte das condições essenciais para a verdade do Jubileu.
Havemos de tomar a sério a nossa condição de pecadores e a necessidade que temos do perdão de Deus, a quem ofendemos sempre que ofendemos os irmãos ou nos afastamos das fontes da vida que Ele nos concede.
Segundo a Escritura, o Ano Jubilar é também o ano da remissão, do voltar ao princípio nas relações com Deus, nas relações com os irmãos, nas relações com os bens materiais e espirituais. Sendo o perdão uma das realidades mais difíceis de encarar, peçamos humildemente ao Senhor que nos perdoe e nos dê a graça de perdoar sem limites. Este é o tempo de refazermos todas as relações interrompidas ou degradadas pelo nosso pecado: no contexto familiar e social, com a nossa comunidade cristã e com a Igreja. Pode também ser o tempo da reconstrução das relações com Deus, caso andemos longe d’Ele pela indiferença ou pelo esvaziar da confiança no Seu amor e no seu perdão.
O Ano Santo leva-nos a retomar o amor ao Sacramento da Penitência, leva-nos a abeirarmo-nos da confissão sacramental dos pecados e a ouvirmos alegres o anúncio: os teus pecados estão perdoados; vai em paz e não voltes a pecar.
“Acima de tudo, revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição”. “A caridade cobre a multidão dos pecados” (1 Pd 4, 8), refere a Primeira Carta de Pedro, dando continuidade ao ensino de Jesus acerca do maior dos mandamentos da Lei.
O Ano Santo é o tempo da manifestação do amor de Deus, expresso também por meio da caridade humana. Não faltam entre nós lugares e situações que clamam por justiça e caridade. O Papa elenca algumas na Bula do Ano Santo, a que havemos de dar mais atenção: os presos, os doentes, os jovens, os migrantes e refugiados, os idosos, os pobres... Mas há também os que clamam por caridade nas nossas casas, nos nossos lugares de trabalho e de ensino; os esposos, os pais e os filhos; os membros das comunidades cristãs, das comunidades religiosas, dos presbitérios; os que se dedicam aos serviços e ministérios na Igreja, seja na ação social, na evangelização e na catequese ou na liturgia.
Não pode acolher-se a graça do Ano Santo sem a conversão à caridade de Deus transformada em caridade dos homens. Este é o tempo oportuno para refazermos todas as nossas relações a partir da caridade.
Irmãos e irmãs, Deus bate à nossa porta com a oferta da graça transformadora do Jubileu e com a Sua misericórdia infinita, que nos abre à felicidade terrena e à bem-aventurança eterna. Respondamos com a conversão do coração e da vida a quem tanto nos ama e nos quer homens e mulheres felizes.
Que a Virgem Maria e São José conduzam os passos da nossa peregrinação ao encontro de Jesus e nos acompanhem no início da nova etapa de fé e de vida que a Igreja nos oferece por meio do Jubileu. Como Maria e José, queremos voltar a casa com Jesus no meio de nós, queremos ser peregrinos da esperança que Ele nos dá.
Coimbra,29 de dezembro de 2024
Virgílio do Nascimento Antunes
Bispo de Coimbra