Vigília da Peregrinação Internacional Aniversaria - Junho 2022 - Fátima :: Homilia de Dom Virgílio

PEREGRINAÇÃO INTERNACIONAL ANIVERSÁRIA – FÁTIMA
VIGÍLIA DA NOITE DE 12 DE JUNHO DE 2022

Caríssimos irmãos e irmãs!

A noite de vigília em Fátima tem um encanto especial para todos nós: corresponde aos nossos anseios interiores, que nos levam à procura do silêncio, da oração, da pacificação do coração.

Sentimos que precisamos de nos recentrar no essencial, tão atormentados andamos pela voragem das ações quotidianas, dos pensamentos, das solicitações, dos ritmos da vida, das preocupações, e essa ação de nos recentrarmos torna-se possível nesta noite de Fátima, porque a peregrinação a este Santuário favorece uma envolvência profundamente humana e religiosa, num quadro de interiorização e manifestação da fé em Deus, que se revela como a luz e a vida.

Tomar a decisão de se fazer peregrino, de ser peregrino, é um ato de grande significado humano. Supõe sempre o apelo a pôr-se a caminho, a querer ir mais longe, a desejar ser mais, a olhar para a própria condição humana e acreditar que está em construção, inacabada. Tomar a decisão de ser peregrino é sinal de humildade, pois reforça a certeza da debilidade, da pobreza e até do pecado, de quem sabe que precisa de sair de si, do seu mundo, pequeno e incompleto.

A Fátima, chegam todas as alegrias do mundo, em atos de gratidão da multidão dos peregrinos, mas chegam também todos os dramas e sofrimentos do mundo, em atos de súplica dolorosamente sentida. Mesmo quem chega indiferente, com ar de observador ou espírito de simples visitante, pode acabar por tropeçar inadvertidamente consigo mesmo e com as questões mais sensíveis que não resolveu ou que decididamente procurou arrumar na zona mais profunda do esquecimento.

Fátima é lugar em que afloram à mente e ao coração os sentimentos mais íntimos que albergamos em nós, quer os que estão bem resolvidos e são fonte de paz, quer os que estão adiados ou mal resolvidos e provocam as turbulências interiores.

Esta vocação de Fátima como lugar para onde convergem todas as alegrias e dores da humanidade, começou logo no tempo das aparições. No dia 13 de junho, que nesta peregrinação evocamos, já Lúcia sente surgirem dentro de si as questões fundamentais que o seu coração alberga.

Enquanto Nossa Senhora pede que voltem ali no dia 13 do mês seguinte, que rezem o terço todos os dias e que aprendam a ler, Lúcia está ocupada com o seu interior, de tal modo que irrompe logo após com dois pedidos que a atormentam: a cura de um doente e que os leve para o Céu. Depois manifesta a pena maior que existe no coração: “Fico cá sozinha?” Recebe a resposta pacificadora: “Não, filha. E tu sofres muito? Não desanimes. O Meu Imaculado Coração será o teu refúgio e o caminho que te conduzirá até Deus”.

Desde aquele já distante ano de 1917 que Fátima tem a vocação e a graça de ser santuário da humanidade peregrina, do encontro íntimo da alma consigo mesma, do aflorar feliz das ondas de alegria e esperança, que dão sentido à vida, mas também do conhecimento das vagas de ansiedades e medos que perturbam e matam.

 

A noite de vigília em Fátima tem ainda mais encanto porque é para nós noite de fé, de encontro com o Deus revelado em Jesus Cristo; de encontro com Maria, mulher e mãe, imagem da Igreja, povo de filhos queridos e amados. Este encontro pessoal e a celebração dos santos mistérios na comunhão da Igreja alimentam a nossa fé, oferecem-nos a graça necessária para agradecermos do fundo do coração tudo o que de bom recebemos e a fortaleza para acolhermos como dom misterioso as realidades mais difíceis e dolorosas que as circunstâncias da vida nos trazem.

Para que não seja estéril, mas se torne espiritualmente libertadora, a noite de vigília e de fé centra-se na escuta da Palavra inspirada de Deus, que dá conteúdo e sentido ao silêncio orante, que abre novos horizontes de luz e de vida ao peregrino.

O texto dos Atos dos Apóstolos que escutámos, centra-nos no anúncio solene de que Deus constituiu Senhor e Messias a Jesus Cristo, o Crucificado. É o centro da fé cristã proclamado por Pedro com os onze Apóstolos a todo o povo e que provocou profunda consternação no coração de todos, pelo facto de também se sentirem corresponsáveis nesse processo de morte.

A pergunta “que havemos de fazer?” surge sempre quando se abre a inteligência e o coração ao anúncio da Boa Nova de Jesus Cristo que liberta e salva. A resposta de Pedro, de acordo com o texto dos Atos dos Apóstolos que escutámos, dá continuidade ao contínuo convite de Jesus dirigido a todos os que encontrou pelos caminhos e de acordo com os Evangelhos, que sintetizam numa única palavra: “convertei-vos!”

O batismo, o dom do Espírito Santo, o perdão dos pecados, a vida em comunidade eclesial assídua ao ensino dos Apóstolos, à comunhão fraterna, à fração do pão e às orações, são os sinais sacramentais e existenciais do caminho de conversão que aceitamos percorrer com humildade.

O encontro com Jesus torna-se sempre profundamente revelador e transformador de cada um de nós, que se aproxima d’Ele carregado com as suas perplexidades e esperanças. Quando damos o passo de peregrinos pomo-nos à escuta e vamos à procura de quem nos procurou primeiro, conhece as nossas zonas sombrias e as trevas que podem paralisar-nos, e nos diz: “eu vim ao mundo como luz”. Diante dos sinais de morte existentes em nós, oferece-nos o seu mandamento que é vida eterna, como ouvíamos no Evangelho de São João.

Abençoada esta noite de vigília que, na escuta da Palavra, na oração e no silêncio nos leva a encontrarmo-nos com o nosso coração, a sintonizarmos com as alegrias e dores da humanidade, a vislumbrarmos em Jesus Cristo, de uma forma nova, a luz e a vida, que procuramos e que o Pai nos quer dar.

 

Nesta noite de vigília em Fátima, sentimo-nos conduzidos pela Virgem Santa Maria, a mulher revestida de sol e que, das suas mãos irradia os reflexos de uma luz intensa, que faz os pastorinhos verem-se como que submergidos em Deus, de acordo com a narração da aparição de junho.

Por sua vez, a Virgem Maria mostra “um coração cercado de espinhos, que parecia estarem-lhe cravados”. Nele estão, com certeza, representadas todas as suas dores da maternidade, do cuidado por Jesus na infância ou na adolescência, quando conhece a Sua rejeição na vida pública, quando O acompanha na paixão e aos pés da cruz. Ali está toda a sua humanidade, sempre iluminada pela luz da esperança da redenção.

No coração de Maria, a Mãe de Deus e nossa Mãe, estão também representados todos os espinhos dolorosos das nossas vidas. Como Mãe e como Irmã, como Discípula e como Igreja plenamente solidária connosco, ela continua a ensinar-nos como havemos de deixar-nos iluminar pela luz de Jesus Cristo e continua a ser refúgio, aconchego e amparo no caminho que nos leva a Deus.

De coração inquieto, continuemos confiantes na nossa condição de peregrinos. De coração cercado de espinhos, Maria continuará solidária com as nossas alegrias e dores.

No seu Coração Imaculado encontraremos segurança e refúgio; pela sua mão chegaremos à paz de Deus. Ámen.

Virgílio do Nascimento Antunes
Bispo de Coimbra

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