1. A Assembleia da
República aprovou um Projecto de Lei com um título ambíguo – "garantias do direito à saúde
reprodutiva – que se afasta ou desconhece, em vários pontos, a dimensão
moral das matérias tratadas. É esse o motivo que nos leva a tomar posição, na
linha da missão da Igreja de contribuir para o esclarecimento e recta formação
da consciência dos cristãos e, mesmo, da população em geral.
Parece ser objectivo deste Projecto de Lei encontrar soluções para
problemas graves e reais que existem na nossa sociedade. Os problemas existem e
são efectivamente graves. Perante eles, a Lei agora aprovada, esquecendo
lamentavelmente os males que estão na raiz, opta, mais uma vez pela via das
soluções pragmáticas, aliás de efeito não garantido.
Ignora-se que, por mais
graves que sejam os problemas, não há soluções humanamente dignas e válidas se
são encontradas à custa do menosprezo pela dignidade da pessoa humana, que se
deve exprimir na moralidade das soluções apresentadas.
Esquecidos os critérios éticos e culturais, resta a reacção,
interveniente e positiva, da consciência dos cidadãos, sobretudo dos pais e dos
educadores, aproveitando todos os meios e momentos de intervenção que o próprio
texto legal prevê e permite.
2. No que à educação
sexual diz respeito, é grave a equação feita do binómio educação / informação,
reduzindo, praticamente, a primeira à segunda. Concordamos que há passos a dar
na forma de inserir na educação, em todas as suas instâncias e níveis etários, a
educação sexual enquanto descoberta da vida como relação generosa e
comprometida, formação para o dom, generoso e gratuito, cultivo da delicadeza,
da beleza e da ternura. A sexualidade é o dinamismo mais abrangente do homem; e
se não há formação integral sem educação da sexualidade, esta não pode ser
isolada da riqueza da personalidade, com as suas componentes somáticas,
psicológicas, espirituais e morais.
A educação sexual supõe a informação sobre os ritmos da sexualidade
humana, mas não se pode reduzir a ela. A informação tem de ser integrada na
descoberta global do sentido humano e espiritual da sexualidade; ao contrário, a
informação fisicista e mecânica dos ritmos da sexualidade, pode tornar-se
degradante para o crescimento global da pessoa.
3. É por isso que a
informação deve ser feita pelas entidades a quem compete garantir a educação na
sua integralidade, com prioridade para a família, sem excluir a escola, os
grupos ou movimentos em que as crianças e os jovens se integram, as Igrejas nas
suas estruturas formativas.
O papel preponderante reservado à escola no texto legal é
problemático e só se explica pela prioridade dada à informação. A família é
relegada para a possível intervenção das associações de pais nas decisões da
escola. A visão interdisciplinar da educação sexual é correcta, o que exige a
qualidade formativa dos docentes, num horizonte global da personalidade do aluno
e no respeito por um quadro cultural de valores sobre que assente um projecto
educativo conhecido e aceite por todos. A informação sobre os mecanismos da
sexualidade, no contexto da escola, isolada dessa perspectiva de formação
global, pode levar a riscos na formação, que nenhum resultado prático
justifica.
No futuro quadro legal instituído por esta Lei, os Pais, os
Professores e responsáveis de escolas têm uma responsabilidade acrescida para
garantir que a escola seja lugar de formação, em sintonia com a família e não
lugar de agressão dos mais delicados sentimentos das nossas crianças e dos
nossos jovens.
4. A doutrina exposta no
texto legal sobre o planeamento familiar afasta-se da doutrina católica sobre
este assunto. O planeamento familiar é uma necessidade e um direito. Mas a sua
concepção não pode ser redutora. Só a consciência das pessoas, depois de
rectamente informadas, pode assumir o caminho escolhido, aceitando, perante si
mesmos, perante a comunidade e perante Deus, os riscos físicos, psicológicos e
morais dessa escolha.
A preocupação mecanicista de resultados eficazes, menosprezou o
enquadramento cultural e ético das questões, lacuna grave numa época dominada
por um constante apelo ao sexo; isso é tanto mais grave quando sabemos que não é
só a ignorância, mas, sobretudo, o desregramento dos costumes, que contribuem
para a multiplicação de casos de aborto.
5. É lamentável que a
prevenção das doenças sexualmente transmissíveis quase se limite à distribuição
gratuita de preservativos nos estabelecimentos de ensino e nos locais de
trabalho. É a abdicação total da perspectiva educativa. As nossas famílias e os
nossos jovens mereciam melhor.
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