1 – O que é a “Teologia do
Corpo”?
A “Teologia do Corpo” é o nome
que o Papa João Paulo II deu ao maior ensinamento do seu pontificado. Ele
apresentou-o em 129 breves audiências entre 1979 e 1984. É uma reflexão bíblica
sobre o significado do corpo humano, em particular no que diz respeito à
sexualidade, ao amor conjugal e ao desejo erótico.
Este ensinamento está dividido
em duas partes principais:
A primeira parte, o que
significa ser humano?
A segunda parte, de que modo
devo eu viver a minha vida, para alcançar a verdadeira felicidade?
Assim, a teologia do corpo do
Papa é uma reflexão nas grandes questões acerca da vida: Porque é que eu
existo? Porque é que Deus nos criou homem e mulher? Como é que eu encontro a
felicidade? Qual é o meu destino final? Porque há mal no mundo? Como posso eu
vencer isso? Todas estas questões universais.
2 – Como é que este
conhecimento dos nossos corpos nos ajuda a encontrar a felicidade?
Na linguagem do Papa, o corpo
revela o mistério de Deus. E este mistério, que foi todo revelado em Jesus
Cristo, é que Deus é amor. Deus é amor no relacionamento entre o Pai, o Filho e
o Espírito Santo.
A teologia do corpo significa
que os nossos corpos de alguma maneira revelam o mistério do amor divino no
mundo. E como faz isso? Precisamente através do mistério da diferença sexual e
da chamada dos dois (homem e mulher) a serem uma só carne.
3 – Então está a dizer que
Deus é revelado na relação entre o homem e a mulher?
No mistério da união conjugal,
temos um sinal aqui na Terra do mistério eterno do amor existente na Santíssima
Trindade. Um sinal que revela o plano eterno de Deus para a humanidade. Este
plano, para continuar com esta analogia, é que Deus quer casar connosco. Esta é
a razão porque Ele nos criou.
4 – Isso é realmente muito
forte. Pode explicar isso melhor?
É muito forte. Se olhar para
as escrituras desde o princípio até ao fim, nós temos uma história acerca do
casamento. O Génesis começa com a criação do homem e da mulher e a sua chamados
ao matrimónio. Por todo o Antigo Testamento os profetas falam do amor de Deus
como sendo o amor de um marido pela sua noiva. No Novo Testamento, o amor do
eterno noivo é literalmente encarnado quando a palavra se faz carne. Saltando
para o fim das escrituras, o livro do Apocalipse descreve o céu como um
casamento eterno – o casamento de Cristo e da Igreja.
O Papa disse de que apesar do
efeito de todas as imagens humanas, as analogias que nós podemos usar para
descrever o amor de Deus são imperfeitas, mas a analogia esponsal é a menos
imperfeita. Esta ajuda-nos a penetrarmos no mistério do amor de Deus. Falando
de um modo mais fácil de entender, aquilo que nós aprendemos deste paradigma é
que Deus quer casar connosco.
5 – Como é que será estar
casado com Deus?
É chamado o céu. Nós podemos
levar esta analogia ainda mais longe e reconhecer que Deus não só quer casar
connosco, mas de um modo místico, Ele quer encher a nossa humanidade com a sua
vida divina.
Se o eterno plano de Deus é
para casar connosco e nos encher com a sua vida divina, Ele quer que este seu
plano eterno seja tão óbvio para nós, que Ele gravou uma imagem dele
directamente nos nossos corpos, ao criar-nos como homem e mulher, e ao
chamar-nos a sermos uma só carne. Isto é a teologia do corpo. Nós vemos o
mistério do amor de Deus revelado nos corpos sexuados, e no seu apelo à união.
O amor sexual é um ícone, ou
imagem terrena, da vida interior e do Amor da Santíssima Trindade. Isto não
quer dizer que Deus seja sexuado. A nossa sexualidade é imagem de Deus, mas
isso não significa que nós possamos dizer que o amor de Deus é sexual. Deus
está infinitamente acima de qualquer diferença entre os sexos.
Se você tiver alguma questão
acerca da moral sexual, chegamos a uma pergunta muito simples: “Isto é imagem
do amor de Deus pela Igreja, ou não?”
O tema da auto-doação vem
inúmeras vezes nos ensinamentos do Santo Padre. Nós descobrimo-nos a nós
próprios ao doarmo-nos ao outro. Cristo vem restaurar o significado original do
corpo, ao doar o seu corpo pela sua noiva: “Este é o Meu Corpo entregue por
vós”. Jesus não fez condições, nada pediu em troca. Ele deu-se totalmente.
6 - Então, como vê esta teologia poder entrar na sociedade
americana? É
sobre voltar atrás na contracepção ou tem mais alguma coisa para além disso?
Tem mais para além disso, mas isso é apenas uma implicação
imediata. Mas não é só uma questão de deitar fora os diafragmas, preservativos
e pílulas. Isso sozinho não vai resolver problema algum. O que é preciso é uma
profunda mudança do coração.
7 –
Qual é o problema com o sexo no mundo de hoje?
O que está errado no mundo de hoje, é que nós deixámos de
compreender o que significa amar. Na nossa cultura, com frequência aquilo que
nós chamamos amor, não é mais do que um homem e uma mulher, ou dois homens, ou
quem quer que seja que usa o outro para o seu próprio prazer egoísta.
O contrário do amor, para o Papa, não é odiar. O contrário do
amor é usar alguém como um meio para satisfazer os meus fins egoístas. Isto não
é uma teologia abstracta – nós sabemos bem que isto é verdade. Quando alguém
nos usa, trata-nos como se nós fôssemos uma coisa e não como a pessoa que somos,
e nós sentimo-nos violados.
Como é que responderia a alguém que diz que tem um grande amor
por um namorado ou por uma namorada e que não está a usá-lo ou usá-la, mas que
por qualquer razão a sua expressão física de amor não é dentro do casamento?
Nós podemos racionalizar o nosso comportamento para qualquer
direcção que quisermos. Pode até muito bem haver elementos verdadeiros do amor,
mesmo numa relação sexual pré-casamento.
Mas a questão não é “eu amo o meu namorado ou a minha namorada”
em termos gerais, mas sim ”este acto é um acto de amor?” O amor não é apenas a
partilha de prazer mútuo. A resposta que o Papa dá é: “O amor sexual só é
autêntico quando é imagem do amor de Deus por nós”
8 – E porque Jesus foi fiel para com a humanidade, o homem e a
mulher de hoje devem ser fiéis para com apenas uma pessoa?
Se nós queremos descobrir o amor que verdadeiramente
ambicionamos, então Cristo é esse amor.
E quando se trata de exprimir o amor sexual, ele tem que ser
livre, total, fiel e fecundo. Este tipo de amor é o matrimónio.
As relações sexuais são onde as palavras das promessas do
casamento são consumadas na carne. Nós queremos dizer com os nossos corpos o
amor a que nós nos comprometemos no altar. Se nós não estamos a fazer isso,
então nós estamos a mentir uns aos outros.
Eu estarei a mentir se eu tiver relações sexuais com alguém com
quem eu não sou casado, porque o meu corpo estará dizendo: “Eu entrego-me a ti
em liberdade, na totalidade, fielmente e fecundamente — estas são as promessas
do casamento — mas eu não me comprometi a isso. Eu não tenho esse propósito no
meu coração.” Eu estarei a dizer qualquer coisa com o meu corpo que não é
verdade.
9 –
Quais são as outras formas em que as pessoas estão a dizer estas não verdades?
A contracepção. Ela muda a linguagem do corpo completamente. Diz
que Deus não é o amor que dá a vida. E da perspectiva cristã, isso é uma
blasfémia.
10 - Na introdução que faz ao seu livro, George Weigel diz que
“respostas a esta teologia, especialmente entre as mulheres, podem ser
surpreendentes”. Que reacções tem tido?
Muito positivas. Para a maioria das pessoas, se houve agitação ou
irritação, a irritação foi, “Eu fui educado na Igreja Católica e nunca ouvi
falar disto, porquê?” Mas também não podemos dizer que não houve pessoas a
resistir a estas conclusões.
11 - A
que é que as pessoas resistem?
Elas resistem ao facto de isto ser um apelo a abraçar a nossa
dignidade, e sobre a nossa dignidade permanece a responsabilidade. Nós somos
chamados a uma grande dose de sacrifício. O amor é difícil.
Infelizmente, por causa de educadores deficientes, os
ensinamentos da Igreja são apresentados como uma longa lista de proibições. O
que esta teologia nos ensina a compreender é que esta é uma ética de libertação
sexual. É a verdade que nos liberta.
12 –
Porque é que a Teologia do Corpo está a dar nas vistas?
Está a dar nas vistas porque nós fomos feridos pela revolução
sexual e estamos desejosos pelo amor verdadeiro.
Eu vou falar só da minha experiência pessoal. Há dez ou onze
anos atrás, quando eu descobri esta teologia, eu fiquei espantadíssimo como é
que este velho e celibatário homem, em Roma, foi capaz de pôr o seu dedo nas
questões mais profundas, agitadas e ardentes do meu coração, e ajudou-me a ver o
sentido no meio delas. E assim que eu a ía lendo, eu dizia para mim mesmo:
“Isto faz sentido. Isto é o amor que eu ando à procura.”
13 –
Que respostas tem recebido da parte das mulheres?
Eu realizo seminários só para as mulheres e começo esses
seminários com um pedido de desculpas pela luxúria dos homens, e pelo modo como
essa luxúria dos homens feriu o coração feminino.
14 –
Tenho a certeza que isso comove muitas mulheres.
Raramente há um olho sem lágrimas. As mulheres foram
profundamente magoadas pela luxúria dos homens, e a maioria delas nunca ouviu um
homem dizer “Desculpa.”
Então eu começo a falar de acordo com a sabedoria de João Paulo
II, e de acordo com algumas das minhas próprias experiências e percepção, esta
linda visão bíblica da grandeza feminina, da sua dignidade e do seu lugar no
plano de salvação de Deus. A maioria das mulheres responde: “Porque é que eu
nunca ouvi isto antes? Onde é que isto estava quando eu cresci dentro da Igreja
Católica?”
15 – Eu interrogo-me acerca da mulher que talvez seja casada e
quer ter este tipo de relacionamento com o seu marido, mas ela já tem, digamos,
quatro filhos. Ela está completamente exausta, e quer saber sobretudo pelo
ponto de vista do controlo da natividade.
Eu refiro-me a isso em qualquer dos meus livros ou gravações
sobre o assunto. Em pouco tempo, eu direi que a Igreja não ensina que você é
obrigada a ter tantos filhos quantos os fisicamente possíveis.
A questão é esta: nós somos livres de escolher ter ou não ter
relações sexuais, mas se escolhemos tê-las, então nós não somos livres de mudar
o seu significado.
Para um casal que tenha uma razão séria para evitar um novo
filho, a Igreja sempre ensinou que a única forma de controlo da natividade que
está de acordo com a dignidade humana é a abstinência. Os métodos modernos de
Planeamento Familiar Natural não são o método do ritmo da sua avó – são 98% a
99% efectivos em ajudar os casais a determinar o seu período de fertilidade.
Com esta informação, eles escolhem como proceder.
As pessoas muitas vezes dizem: “Ora essa. Qual é a diferença
entre tornar o acto estéril, ou esperar que ele seja naturalmente infértil? O
resultado final é o mesmo. Ambos os casais estão a evitar ter filhos.”
A
isto eu respondo: se souber compreender a diferença que há entre matar a avó ou
esperar que ela morra naturalmente, então saberá a diferença entre a
contracepção e o Planeamento Familiar Natural.
16 – E acerca das pessoas solteiras que talvez não queiram ser
solteiras, mas permanecem assim? Elas não são chamadas ao celibato, não são
chamadas a serem padres ou freiras.
O amor sexual ou amor conjugal é um paradigma para todo o amor
humano. Sempre que nós servimos os outros mais do que a nós próprios, nós
estamos a viver o significado nupcial do nosso corpo. Sempre que nós nos damos
aos outros, no trabalho, em casa, no serviço de comunidade, ou com os amigos,
com toda a família. Ninguém, seja qual for o seu estado de vida, está fora
desta visão.
17 – Dado que a nossa cultura é descrita como saturada de sexo,
como é que pensa que o mundo seria se todos seguissem isto?
Se nós soubéssemos como o sexo é valioso, nós teríamos um mundo
de homens e mulheres que quereriam fazer todos os sacrifícios necessários para
amar verdadeiramente.
Se o homem e a mulher viverem esta visão, haverá um mundo de paz,
um mundo de harmonia. Não sem dificuldades, porque viver esta visão é muito
difícil. Mas se o homem e a mulher tomarem isto a peito, apesar dos desafios,
deixará de haver guerras, divórcios, sida… O mundo será a cultura da vida, a
civilização do amor.
Esta entrevista foi dada por Christopher West à Beliefnet.com, no
ano de 2004, mas mantém toda a sua actualidade.
O título da entrevista em inglês é: “Telling
Lies with the Body.” O original pode ser consultado em:
http://www.beliefnet.com/Faiths/Christianity/Catholic/2004/08/Telling-Lies-With-The-Body.aspx
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