Ao abordar-se o «acolhimento pastoral», não pode ser esquecida uma das tensões da estrutura pastoral em que a maioria das comunidades está imersa e que se situa entre uns «poucos» que formam a paróquia e uns «muitos» que está «fora» dela. Muitos podem justificar a importância e a «validade» dos «poucos», argumentando com o «sonho» de que os mesmos se porão ao serviço dos tais «muitos». Na verdade, são estes «poucos» os que se comprometem, que «fazem tudo» e a quem muito se deve, mesmo que nem sempre correspondam como seria desejável… fazem o que podem! Contudo, é sintomática, mas disfarçada, a sensação de frustração e até de culpa que sofrem os agentes pastorais, por esses «muitos» estarem «fora» e pelos «poucos» ficarem acomodados, «dentro».
A este propósito, são inúmeras as passagens bíblicas, onde constatamos que o divino Mestre nunca descuida a multidão, embora se dedique preferencialmente aos «pequenos grupos». Estes, nada têm a ver com os atuais «grupinhos» ou «feudos» de tantas «igrejas», nem se podem classificar na mediática classe das «elites» virtuosas e religiosamente competentes, a outros níveis! Mas o que definitivamente se pode descortinar é que o Senhor Jesus ama a todos e quer estar presente e atuante em cada um. Há, com isto, um claro desafio, hoje, para comunidade cristã que vive em estado de «acolhimento pastoral»: superar o contraste entre a «multidão» que não se consegue juntar e o pequeno grupo que parece já não servir...
Para tal superação, entre muitas coisas, é importante a atenção aos «encontros casuais» da e na vida dos que a comunidade é chamada a servir e não, somente, «gastar-se» em grandes iniciativas que servem, aparentemente, para recrutar «gentes»! No fundo, trata-se de valorizar e provocar os encontros que surgem na vida diária, onde a Igreja se deve situar, e fazer deles momentos de «acolhimento pastoral». Tudo se tornará mais acolhedor pelo simples facto de, em cada encontro relacionado com a vida de cada dia, se prestar atenção à pessoa, à sua situação e às suas perguntas, às suas exigências implícitas e explícitas, superando sempre a aspereza das primeiras resistências. Trata-se de dar a toda a vida das paróquias a prontidão de uma atitude de «acolhimento pastoral» para que todos se sintam bem.
Vai contra esta atitude toda a rigidez, toda a desconfiança frente aos que «não são dos nossos», toda a forma expedita com que se despacham, com poucas palavras, certas perguntas um tanto ou quanto impertinentes, ou não se permitir que se fale das coisas da vida porque são secundárias em relação às «legalidades». Há pessoas que vão pouco às sacristias e às secretarias paroquiais, e chegam a ficar perturbadas por se encontrarem num ambiente tão «inusual». Isto porque ignoram as «competências vaidosas», as «hierarquias locais», as «cumplicidades e favorecimentos» e não sabem ler a «gramática do poder» com que muitos conjugam a vida das comunidades, escondendo as suas fragilidades.
O «acolhimento pastoral» exige, por isso, «dor pelo outro» ser diferente ou ser contra, paciência, «doçura», também com os mais rudes, e a compreensão de que por detrás de cada um há uma pessoa que se sente algo «reprimida» por tanta coisa estranha que não sabe decifrar, mas que, ao mesmo tempo, está à procura de algo, que tem perguntas dolorosas que não sabe sequer como exprimir e dons que não sabe como transmitir. Por fim, o «acolhimento pastoral» implica que se fale e atue sempre a partir da forte consciência interior que cada um tem de si mesmo e da sua missão. Desta consciência brotam de forma espontânea as afirmações, as superações de bloqueios, e, pouco a pouco, chega-se ao essencial e ao determinante.
Uma pessoa que visitou Roma, ultimamente, contava que depois de uma «audiência das quartas-feiras» em que participou, tinha-se sentido acolhida, próxima, respeitada, atraída… pelo Papa Francisco. Ao dizer isto, com espanto, contava que, com ela, nesse dia, na Praça de São Pedro, na referida audiência, estavam mais de vinte mil pessoas!
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