DIOCESE DE COIMBRA
Plano Pastoral 2021-2024
Introdução
Este Plano Pastoral assume dois acontecimentos e duas realidades que, nos próximos anos, terão muito impacto no dinamismo eclesial da Igreja em Portugal e, consequentemente, também na nossa Diocese: as consequências diretas e indiretas da pandemia e a vivência da Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023.
Por um lado, ainda estamos a viver uma pandemia que não sabemos quando acabará nem quais as reais consequências da mesma na sociedade e nos dinamismos eclesiais. Temos de considerar vários aspetos: os medos que decorrem desta pandemia e que alteram os hábitos de encontro, de reunião, de mobilidade, de presença; considerar o número elevado de mortos com consequências demográficas e o número elevado de lutos que ficaram por fazer; considerar o desemprego e a precariedade laboral que se viu muito agravada pelos reflexos da pandemia em vários setores empresariais; considerar a capacidade mobilizadora de muitas pessoas e comunidades em torno de causas neste tempo; referir a reforçada importância dada às relações mais próximas e ao contacto com a natureza em detrimento das multidões e dos ajuntamentos; considerar a relevância dos meios de comunicação social e as novas formas de conectividade na sua ambiguidade entre muitas coisas positivas e negativas.
Por outro lado, não podemos deixar de sublinhar a importância da Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023. Pode ser uma enorme oportunidade de renovação e de envolvimento de todos neste dinamismo de fé e de discernimento vocacional. Certamente que muitas expetativas ficarão aquém do desejado, mas muitas concretizações serão uma imensa oportunidade evangelizadora que não podemos desperdiçar, quer na preparação das mesmas, quer na vivência da pré-Jornada, quer na própria Jornada, quer na pós-Jornada. Poderá ser um tempo para reaproximar os jovens e os adultos da Igreja, da prática cristã e dos sacramentos. Uma oportunidade reforçada pelo acolhimento generalizado da figura do atual Papa, tanto por crentes (católicos, outras confissões cristãs e outras religiões), como por não crentes.
Estes dois acontecimentos não podem ignorar uma realidade mais dura que vamos sentindo em toda a Europa: um continente envelhecido, com poucos jovens, com perda de protagonismo geopolítico no mundo, com dificuldade em manter a sustentabilidade do modelo humanista e social e, sobretudo, com várias instituições a perder relevância social e política.
A Igreja Católica na Europa não é imune a essa realidade e também sente as suas comunidades mais envelhecidas, sente que não é a única voz nem a mais ouvida na sociedade, que os grupos tendem a ser mais pequenos e, muitas vezes, vivem numa certa tensão (veja-se desde logo, a tensão entre movimentos e paróquias ou os diferentes modos de acolher o Vaticano II). Já não vivemos no tempo da cristandade. As comunidades cristãs começam a perceber-se como ‘minorias’. Contudo, a maior questão, neste ponto, é refletir se somos minorias criativas segundo o Evangelho ou minorias que se acomodam e se instalam em rotinas desligadas do compromisso social e do testemunho cristão.
Sentimos que hoje há desejo de Deus, que há sinais de algum regresso ao sagrado e que em muitos homens e mulheres há uma busca espiritual. Contudo, como nos recorda o Papa Francisco, ‘esses fenómenos são ambíguos’ (cf. EG, 89). “Mais do que o ateísmo, o desafio que hoje se nos apresenta é responder adequadamente à sede de Deus de muitas pessoas, para que não tenham de ir apagá-la com propostas alienantes ou com um Jesus Cristo sem carne e sem compromisso com o outro. Se não encontram na Igreja uma espiritualidade que os cure, liberte, encha de vida e de paz, ao mesmo tempo que os chame à comunhão solidária e à fecundidade missionária, acabarão enganados por propostas que não humanizam nem dão glória a Deus” (EG, 89).
Antes de mais, precisamos de reforçar e alimentar a fé de todos os que se consideram cristãos praticantes. Que os cristãos celebrem o dom da vida com alegria e com entusiasmo, com profundidade e com sentido de missão, porque nós não temos uma missão, nós somos uma missão nesta terra (cf. EG, 273). Temos de ajudar cada cristão, em qualquer idade e circunstância, a sentir que “há uma necessidade imperiosa de evangelizar as culturas para inculturar o Evangelho” (EG, 69).
Mas, por outro lado, precisamos muito de ir ao encontro dos ‘buscadores’, de todos os que andam à procura de um sentido maior. Precisamos de lugares e de tempos de escuta, de momentos em que vamos ao encontro. Precisamos de abrir as portas das igrejas não só para acolher, mas também para sair ao encontro dos que estão feridos à beira do caminho e dos que andam desanimados. O Papa Francisco fala-nos de uma ‘Igreja em saída’ e diz que “a Igreja ‘em saída’ é uma Igreja com as portas abertas” (EG, 46).
Apesar de todas as dificuldades que possamos encontrar, necessitamos de construir o presente e de incarnar o Evangelho. No nosso ADN de cristãos está o Êxodo e a Terra Prometida, o exílio e o regresso a Jerusalém, a perseguição e a coragem do anúncio. Por isso, precisamos de uma Igreja que se deixe guiar pelo Espírito e que não se acomode às dificuldades, porque “as dificuldades que parecem enormes são a oportunidade para crescer, e não desculpa para a tristeza” (FT, 78). Este pode ser um tempo privilegiado que reclama o espírito das primeiras comunidades e a ‘coragem criativa’ dos apóstolos e dos missionários. Animados pelo Ressuscitado e com a força do Espírito, somos a Igreja que nasceu na manhã de Pentecostes.
Recordamos que este Plano Pastoral retoma o dinamismo sinodal como método e como força de comunhão e de compromisso, dinamismo que já é uma realidade na nossa Diocese e que queremos cada vez mais presente nos diferentes organismos e dinamismos eclesiais. Em concreto, este Plano tem em consideração a avaliação do anterior e, sobretudo, o contributo resultante das respostas aos questionários realizados na nossa Diocese (Questionário A - Conselhos Pastorais e Equipas de Animação Pastoral; Questionário B - jovens integrados na Igreja; Questionário C - não crentes e afastados da Igreja). Foram várias as respostas recebidas, a que se seguiu um trabalho de síntese que inspira este Plano e que deixa muitas referências importantes para a sua concretização. Este é um trabalho que pertence a muitos e que confiamos a Deus Trindade para que possamos continuar a construir o Reino de Deus nesta Diocese de Coimbra com entusiasmo e alegria, compromisso e empenho, inteligência e carinho, com gestos proféticos e compaixão, com sabedoria e, sobretudo, esperança.
Por fim, importa sublinhar que o Plano Pastoral 2021-2024 não é apenas para os jovens, mas para toda a Diocese de Coimbra. Trata-se de um Plano que não é setorial ou para uma determinada faixa etária, mas que há de envolver todas as idades e todos os setores, grupos e movimentos da Diocese.
Estrutura do Plano Pastoral
■ Objetivos
1. Envolver os jovens na edificação da Igreja
2. Proporcionar aos jovens o encontro com Jesus Cristo
3. Acompanhar o discernimento vocacional dos jovens
■ Dinamismos ligados a cada objetivo
Objetivo 1 - Envolver os jovens na edificação da Igreja
1.1. Dinamismo de pertença
1.2. Dinamismo do encontro
1.3. Dinamismo da participação na comunidade
Objetivo 2 - Proporcionar aos jovens o encontro com Jesus Cristo
2.1. Dinamismo do primeiro anúncio
2.2. Dinamismo do crescimento na fé
2.3. Dinamismo da oração
Objetivo 3 - Acompanhar o discernimento vocacional dos jovens
3.1. Dinamismo da amizade com Cristo
3.2. Dinamismo do “ser para os outros”
3.3. Dinamismo das vocações na Igreja
TRÊS OBJETIVOS
Estes três objetivos revelam-se como metas que queremos alcançar, conscientes de que cada um deles vale por si mesmo, tendo, ao mesmo tempo, relação com os outros dois. Estes objetivos não devem ser entendidos como uma sequência, mas são para operacionalizar em simultâneo.
1. ENVOLVER OS JOVENS NA EDIFICAÇÃO DA IGREJA
Uma presença desejada
Comecemos por dizer que há muitos adolescentes e jovens presentes na vida da Igreja. Basta pensar, na nossa Diocese, nos jovens que semanalmente estão envolvidos na Catequese, no CNE, nos Grupos de Jovens, nos Grupos do Ensino Superior, nos serviços pastorais (coros litúrgicos, acólitos, catequistas, grupos de voluntariado socio-caritativo). A Igreja é a maior ‘escola’ de voluntariado nestas idades. Contudo, todos sentimos a falta de adolescentes e jovens na celebração da missa e noutros momentos da comunidade. Este desfasamento obriga-nos, necessariamente, a renovar os dinamismos da pastoral comunitária para os tornar mais adequados aos objetivos de evangelização e vida eclesial nesta faixa etária.
Protagonistas da ação da Igreja
Este olhar exige que reforcemos dinamismos que envolvam, cada vez mais, os jovens na edificação da Igreja. O envolvimento passa pela escuta e por torná-los protagonistas da própria ação da Igreja. Precisamos, por um lado, de escutar as suas necessidades, as suas angústias, as suas ideias, as suas opiniões, as suas alegrias, as suas perspetivas e as suas sugestões. Por outro lado, precisamos de tornar os jovens mais protagonistas do agir pastoral e da evangelização (cf. ChV, 202). Não basta acolher os jovens, é preciso torná-los protagonistas. O Papa Francisco recorda-nos que “muitos jovens cansam-se dos nossos programas de formação doutrinal, e mesmo espiritual, e às vezes reclamam a possibilidade de ser mais protagonistas em atividades que façam algo pelas pessoas” (ChV, 225).
‘Sair do sofá’
Um dos maiores desafios de hoje será ‘tirar’ os jovens de casa, do telemóvel, dos seus comodismos. A este propósito o Papa insiste: “Jovens, não renuncieis ao melhor da vossa juventude, não fiqueis a observar a vida da varanda. Não confundais a felicidade com um sofá nem passeis toda a vossa vida diante dum visor” (ChV, 143). No entanto, importa sublinhar que hoje o envolvimento passa por novas formas e novos ambientes, onde não podemos esquecer o papel dos meios de comunicação social. “Em muitos países, a web e as redes sociais já constituem um lugar indispensável para se alcançar e envolver os jovens nas próprias iniciativas e atividades pastorais” (ChV, 87).
Cultivar a proximidade
O envolvimento passa por compromissos concretos, por convites objetivos, por relações pessoais e próximas. À imagem da relação de Jesus com os seus discípulos, precisamos de ‘perder’ tempo com eles, de ir ao seu encontro nos locais de estudo e de vida, precisamos de ter lugares para eles nas nossas comunidades. Precisamos de contar verdadeiramente com eles, com as suas ideias, com a sua participação na construção das comunidades cristãs.
A força do testemunho
Este envolvimento não pode ignorar e esquecer os que estão ‘fora’ da Igreja, desde logo, os que não andam na catequese nem participam na celebração da missa. Certamente que este será o maior desafio para o qual os próprios jovens são determinantes como primeiros e principais evangelizadores dos outros jovens (cf. ChV, 219) – uma missão que não é fácil nem cómoda (cf. ChV, 178). Precisamos de jovens que digam a outros: ‘Deus Ama-te’ (ChV, 112); Cristo Vive (cf. ChV, 124); Cristo poderá estar na tua vida, em cada momento, para a encher de luz (cf. ChV, 125); Cristo quer que tenhas mais vida e vida em abundância (cf. Jo 10,10).
2. PROPORCIONAR AOS JOVENS O ENCONTRO COM JESUS CRISTO
Encontro pessoal e comunitário
Toda a relação começa num encontro pessoal. O encontro reforça laços, empatia e cumplicidade. Muitas vezes, corremos o risco de andar ‘desencontrados’ e, por isso, fechados em nós mesmos, desencontrados dos outros, de Deus e até de nós próprios. Este desencontro tem consequências na própria comunidade. Onde não há encontro sobra egoísmo, invejas e conflitos.
Por isso, cada comunidade cristã e cada dinamismo eclesial deve procurar proporcionar aos jovens o encontro pessoal com Cristo, encontro sereno e pleno, capaz de entusiasmar e reforçar compromissos. Precisamos de dizer a cada jovem: “Ele pode mudar a tua vida, pode iluminá-la e dar-lhe um rumo melhor’” (ChV, 131).
Keryma e amor fraterno
Neste objetivo precisamos de assumir um plano “que esteja centrado em dois grandes eixos: um é o aprofundamento do Kerygma, a experiência fundante do encontro com Deus através de Cristo morto e ressuscitado; o outro é o crescimento no amor fraterno, na vida comunitária, no serviço” (ChV, 213).
Neste sentido, quanto ao Kerygma ou primeiro anúncio, toda a “pastoral juvenil deveria incluir sempre momentos que ajudem a renovar e aprofundar a experiência pessoal do amor de Deus e de Jesus Cristo vivo. Fá-lo-á valendo-se de vários recursos: testemunhos, cânticos, momentos de adoração, espaços de reflexão espiritual com a Sagrada Escritura e, inclusivamente, com vários estímulos através das redes sociais” (ChV, 214). Quanto ao segundo eixo, o crescimento no amor fraterno “deve incorporar claramente meios e recursos variados para ajudar os jovens a crescerem na fraternidade, a viverem como irmãos, a ajudarem-se mutuamente, a criarem comunidade, a servirem os outros, a estarem perto dos pobres” (ChV, 215).
Para uma vida cheia de sentido
O encontro pessoal e comunitário com Cristo abre-nos a uma existência cheia de sentido, uma felicidade que mais não é do que o caminho da santidade. De facto, “ser santo não significa revirar os olhos num suposto êxtase” (GE, 96). Ser santo é ser feliz à maneira de Cristo como podemos perceber nas bem-aventuranças (cf. GE, 64), uma felicidade, feita de gestos e de palavras concretas, que se vê no rosto e no ‘estilo de vida’ quotidiano.
Esta vida de santidade precisa de ser alimentada nos sacramentos, especialmente na Eucaristia e na Reconciliação, e nos múltiplos encontros da comunidade e do compromisso cristão. Muitos jovens de hoje “pedem propostas de oração e momentos sacramentais que incluam a sua vida quotidiana numa liturgia nova, autêntica e alegre” (ChV, 224).
Mas não “podemos separar a formação espiritual da formação cultural” (ChV, 223) e social. Não podemos esquecer as áreas da filosofia, das humanidades, da ecologia integral (cf. LS, 11), da justiça e da caridade; nem as expressões artísticas do teatro, da música, da pintura... (cf. ChV, 226).
3. ACOMPANHAR O DISCERNIMENTO VOCACIONAL DOS JOVENS
Caminho acompanhado
Todo o discernimento profundo exige não só confronto com a Palavra de Deus, mas também o diálogo com pessoas que podem ajudar a ver mais claro o caminho. O acompanhamento é determinante no processo do discernimento. Também “os jovens precisam (...) de ser acompanhados. A família deveria ser o primeiro espaço de acompanhamento. Por isso, é necessário que a pastoral juvenil e a pastoral familiar tenham uma continuidade natural, trabalhando de maneira coordenada e integrada para se poder acompanhar adequadamente o processo vocacional” (ChV, 242).
Experiência de liberdade
Mas neste discernimento vocacional, diz o Papa que os jovens podem ser acompanhados por sacerdotes, religiosos, religiosas, leigos, profissionais e até jovens capacitados para tal (Cf. ChV, 291). O fundamental é ter presente que “um bom discernimento é um caminho de liberdade que faz aflorar esse carácter único de cada pessoa, isso que é tão seu, tão pessoal, que só Deus conhece” (ChV, 295).
Caminhar com Jesus
Neste sentido, “para discernir a própria vocação, deve-se reconhecer que essa vocação é o chamamento de um amigo: Jesus” (ChV 287). De facto, o Papa propõe este ‘discernimento de amizade’ como modelo para descobrir qual a vontade de Deus para a vida de cada pessoa (Cf. ChV, 287), um Deus que se faz companheiro de viagem como Jesus com os discípulos de Emaús (cf. Lc 24, 13-32).
Uma vida irrepetível
Neste discernimento acompanhado por Cristo e por outras pessoas, cada jovem é desafiado a ser ele mesmo e não uma fotocópia (cf. ChV, 106). Diz o Papa Francisco: “atreve-te a ser mais, porque o teu ser é mais importante do que qualquer outra coisa. (...) Assim não serás uma fotocópia. Serás plenamente tu próprio” (ChV, 107).
Ser para os outros
Contudo, alerta: “tu podes interrogar-te sobre quem és e passar uma vida inteira a procurar a tua própria identidade. Interroga-te, antes ‘para quem sou eu?’” (ChV, 286). No fundo precisamos de nos interrogar: “Como posso servir melhor e ser mais útil ao mundo e à Igreja? Qual é o meu lugar nesta terra? Que poderia eu oferecer à sociedade?” (ChV, 285). Para ajudar a encontrar resposta a estas perguntas importa comprometer os jovens “em iniciativas de voluntariado, de cidadania ativa e de solidariedade social” (ChV, 170).
Caminho batismal
Todos estes dinamismos hão de ajudar cada jovem a descobrir a sua própria vocação. Todos temos uma vocação. Todos somos chamados à vida, à vida plena, à vida em Deus. Todos somos desafiados a sermos felizes com os critérios do Evangelho, isto é, à maneira de Jesus Cristo. A partir do nosso batismo, precisamos de descobrir como podemos concretizar essa vocação: como família, como padre, como religioso, como missionário, como consagrado, como leigo...
A vocação não se esgota no horizonte eclesial, mas abre-se também ao mundo e realiza-se para além das ‘paredes da igreja’: na profissão, na política, no associativismo, no voluntariado, nas diferentes relações quotidianas.
NOVE DINAMISMOS
Os dinamismos são propostas de concretização dos objetivos. Tal como foi referido a propósito dos objetivos, também os dinamismos são para operacionalizar em simultâneo, a nível pessoal e comunitário, e não devem ser entendidos como uma sequência.
I. Envolver os jovens na edificação da Igreja
1.1 Dinamismo de pertença
Muitos jovens hoje dizem que não se identificam com a Igreja, com as suas ideias, com a sua doutrina e com a sua moral; dizem que é ‘uma seca’, ‘de velhos’, um ‘lugar de punição’; acham as celebrações longas, aborrecidas; as catequeses são pobres; há atividades em excesso e nem sempre adaptadas aos seus interesses; não se identificam com as pessoas da Igreja; têm medo de serem gozados pelos colegas; não se sentem acolhidos… o que manifesta que, genericamente, não têm sentido de pertença.
Alguns referem que, simplesmente, se foram ‘desligando’ e afastando da prática dominical e da catequese, revelando que muito deste afastamento decorre das próprias famílias que também já não participam. Referem ainda que o afastamento também tem a ver com a falta de uma explicação de quem é Deus diante da muita informação científica e com comportamentos ligados a pessoas da Igreja (como quezílias e hipocrisia). O afastamento e o desconhecimento são algumas das razões do seu alheamento eclesial.
No entanto, alguns jovens referem o sentido de pertença pela tradição familiar e ligados a expressões de religiosidade popular; reconhecem credibilidade na Igreja e nos seus membros, dizem que admiram a bondade, a honestidade, a convicção, os valores, a disponibilidade para ajudar e quererem o bem das outras pessoas, pessoas positivas e generosas, pessoas que acreditam em algo maior do que esta vida terrena e pessoas com muita esperança. Reconhecem que é uma das maiores fontes de desenvolvimento da criatividade e do espírito crítico.
Cada comunidade cristã assume o desafio de ser mais próxima dos jovens, mais acolhedora, mais inclusiva, mais aberta, mais atual e de tornar os jovens mais protagonistas da própria ação da Igreja.
1.2 Dinamismo do encontro
Muitos jovens dizem que as atividades e os sacramentos precisam de ser verdadeiros momentos de encontro e não apenas ‘atividades de calendário’. Sentem falta de momentos profundos de oração, de retiros, de missas campais, de peregrinações, de concertos solidários, de acampamentos e de voluntariado.
Alguns dizem que procuram saciar a sua espiritualidade fora da Igreja, porque não encontram aí o que procuram. A espiritualidade aparece aqui como algo mais interior e mais individual, menos comunitário e menos comprometido com a sociedade.
Outros dizem que a missa devia ser mais participada e interativa, mais apelativa, com cânticos mais animados e com homilias mais próximas à vida concreta; que as missas não sejam só ‘ouvir o padre, levantar e voltar a sentar’; pedem que os padres tenham um discurso mais cativante, as catequeses sejam mais dinâmicas e que haja maior abertura para se falar de temas da atualidade (como a sexualidade, tecnologia e a ecologia).
Cada comunidade cristã assume o desafio de tornar a missa mais participada e apelativa; de promover atividades, itinerários e espaços de diálogo aberto e de escuta autêntica e respeitadora.
1.3 Dinamismo da participação
Muitos jovens revelam falta de interesse em participar na comunidade, ou porque sentem que as atividades têm pouco interesse para eles ou porque têm outras atividades que entram em ‘conflito’. Também é expresso o desejo de ficar em casa ou com um pequeno grupo, mais do que participar em atividades da Igreja, da escola ou outras.
Durante a pandemia insistiu-se muito no ficar em casa, agora a dificuldade maior, para muitos, é ‘sair de casa’. Toda a vida familiar e social se centrou em poucos contactos. O medo dos contágios, o comodismo e o conforto de casa, entre outros, são razão e, muitas vezes, desculpa para evitar as atividades de grupo ou a presença na comunidade.
Cada comunidade cristã assume o desafio de promover mais atividades dirigidas aos jovens: encontros de formação (litúrgica, bíblica e humana); intercâmbio entre grupos de jovens; participação em encontros diocesanos, nacionais e internacionais; valorização dos projetos ‘Say Yes’, ‘Rise Up’, YouCat, DoCat…; criação de grupos de pastoral juvenil; valorização e integração dos jovens nas estruturas de corresponsabilidade, nos movimentos e nos serviços paroquiais/unidade pastorais (catequistas, acólitos, coros…).
II. Proporcionar aos jovens o encontro com Jesus Cristo
2.1 Dinamismo do primeiro anúncio
Muitos referem que estão desligados da Igreja ou que a sua ligação é muito frágil e pontual. Já não estamos numa cultura em que o cristianismo seja um dado adquirido e começa a faltar uma gramática comum, necessária para uma comunicação. Pelo que, cada vez mais, o dinamismo do primeiro anúncio reclama uma particular atenção pastoral.
De algum modo, teremos de falar, mesmo antes de um primeiro anúncio, de um primeiro contacto, um primeiro ‘link’, onde os jovens se conectem com o religioso e com Jesus Cristo. Esse primeiro contacto continua a contar com o testemunho de outros jovens, mas hoje teremos de considerar também as próprias redes sociais e os conteúdos na internet. Esta primeira aproximação precisa da ‘coragem criativa’ do Evangelho que tudo faz para anunciar Cristo.
Cada comunidade cristã assume o desafio de estar presente nos diferentes contextos e plataformas onde os jovens se encontram (redes sociais, desporto, música, artes…) de forma a sensibilizar e a preparar para o anúncio do Evangelho. Assume ainda o desafio de propor experiências de aprofundamento da fé, ou mesmo de primeiro anúncio, recorrendo a grupos juvenis da Paróquia/Unidade Pastoral, Alpha Jovem, Convívios Fraternos, Educação Moral Religiosa Católica e outros movimentos de espiritualidade juvenil.
2.2 Dinamismo do crescimento na fé
Muitos jovens referem que faltam espaços de debate onde se possam discutir abertamente ideias e necessidades relacionadas com a fé e os valores da Igreja; faltam atividades mistas que conjuguem convívio-tema-partilha de opiniões; faltam espaços físicos dedicados aos grupos de jovens e atividades onde todas as faixas etárias se possam interligar.
Alguns jovens falam da importância dos movimentos e dos grandes eventos, como as Jornadas Mundiais da Juventude, a Oração Mensal das JMJ, a Missão País, a peregrinação a Taizé e a Santiago de Compostela, o Escutismo, a juventude da Ação Católica, a Pastoral Juvenil, a Pastoral do Ensino Superior, o Shalom, a Comunidade Emanuel, a Mensagem de Fátima, o GVX (Grupos de Vida Cristã), o Caminho Neocatecumenal, o Verbum Dei, retiros, campos de férias paroquiais e campos de trabalho da Cáritas.
Cada comunidade cristã assume o desafio prioritário de criar uma equipa de pastoral juvenil local que inclua jovens e adultos; de criar ou apoiar a criação de espaços físicos dedicados aos jovens; de promover diferentes iniciativas e atividades para despertar e alimentar a fé em Jesus Cristo; de propor a abordagem cristã de temas como a família, o estudo, o trabalho, o associativismo, a ecologia, a economia, a arte, a política, o voluntariado.
2.3 Dinamismo da oração
Muitos jovens deixam perceber que a vivência dos sacramentos não é compreendida como essencial e determinante das suas vidas, vendo-os mais como uma festa social e da comunidade cristã do que uma vivência profunda de encontro e de oração. Muitas vezes a proposta da Igreja não permite que os próprios momentos celebrativos sejam profundos, serenos, orantes e transformadores, faltando frequentemente silêncio, conteúdo e a alegria do Espírito Santo.
Para além das dificuldades dos momentos comunitários, todos percebemos a dificuldade que muitos jovens e adultos têm de parar para rezar, por ‘falta de tempo’, por falta de hábito ou porque, simplesmente, não sabem o que fazer e dizer diante do Senhor.
Cada comunidade cristã assume o desafio de celebrar a Eucaristia dando mais espaço à participação dos jovens (grupo coral, acólitos, leitores…); de cuidar da homilia que deve ser “uma experiência intensa e feliz do Espírito, um consolador encontro com a Palavra, uma fonte constante de renovação e crescimento” (EG, 135); de promover a lectio divina com os jovens, tornando assim a Palavra de Deus mais acessível; de propor momentos de contemplação, de retiro e conteúdos para a oração pessoal e de grupo.
III. Acompanhar o discernimento vocacional dos jovens
3.1 Dinamismo da amizade com Cristo
Muitos jovens dizem que admiram Jesus Cristo e destacam as seguintes referências: bondade, amor por todos, compaixão, solidariedade, fidelidade a si mesmo, capacidade de perdão, tolerância, capacidade de ensinar e atrair, dedicação e doação total da vida, humildade, simplicidade, genialidade, capacidade de aguentar a dor extrema, empatia, proximidade.
Contudo, não basta esta admiração para estabelecer uma relação, é preciso escolher Jesus como um amigo e um companheiro da viagem da vida e, sobretudo, experimentar que Jesus foi quem nos escolheu primeiro. É preciso descobrir Jesus como Salvador e fonte de santidade, como critério de discernimento e referência existencial.
Cada comunidade cristã assume o desafiode apresentar Jesus Cristo numa perspetiva integral; de tornar Jesus Cristo o centro permanente de toda a atividade com os jovens com um ‘novo entusiasmo, novos métodos e novas expressões’ (cf. João Paulo II, 9 de março de 1983, Haiti).
3.2 Dinamismo do ‘Ser para os outros’
Muitos falam da importância de ações de voluntariado (dentro e fora da comunidade eclesial), da ajuda aos mais pobres das comunidades, das campanhas solidárias e financeiras para ajudar os vários grupos nas atividades durante o ano, das ações na defesa e do cuidado da natureza.
Num tempo de poucas causas, certamente que todos já percebemos a importância e a relevância do voluntariado e da ecologia. A Igreja precisa de pegar nestes dois temas com ações concretas e dinamismos próprios para que sejam, não apenas ações sociais, mas atitudes de profundo encontro com Cristo e com o Criador.
Cada comunidade cristã assume o desafiode dar a conhecer as várias oportunidades de serviço existentes na Paróquia/Unidade Pastoral e de proporcionar a sua participação nas mesmas; de dar a conhecer e promover a participação de jovens em serviços de voluntariado, a ação social e caritativa, como uma oportunidade especial de descoberta da vocação e do sentido mais profundo da vida; de sensibilizar e envolver os jovens na promoção de uma ecologia integral (cf. LS).
3.3 Dinamismo das vocações na Igreja
Muitos jovens referem que desejam ser felizes, mas associam ‘ser feliz’, sobretudo, ao êxito na família, no trabalho, no reconhecimento social e na saúde. Trata-se de uma felicidade ligada mais ao ter do que ao ser, mais a aproveitar a vida e as oportunidades, ter vida estável e próspera, ganhar dinheiro e viajar pelo mundo. Por isso, diante do futuro, dizem que o melhor é aproveitar o momento e viver um dia de cada vez.
No entanto, muitos desejam algo mais profundo e dizem que o trabalho não devia ocupar tanto tempo, nem devia ser a prioridade. Falam numa felicidade que passa por ajudar os outros, cuidar do planeta e construir uma família. De facto, revelam que a família é o pilar das suas vidas, que surge como porto de abrigo, âncora e suporte. Alguns referem marcas negativas na sua experiência familiar, desde violência, discussões, separações... e manifestam o desejo de não cometer os mesmos erros.
Os jovens admiram a vocação religiosa ou de consagração, a dedicação e a ajuda aos mais carenciados. Reconhecem a necessidade e a coragem de dizer ‘sim’ a Deus, a grande generosidade e disponibilidade de coração, a capacidade de transmitirem a mensagem de Deus, mas, genericamente, não a consideram uma possibilidade para si mesmos.
Cada comunidade cristã assume o desafio de organizar localmente um serviço de pastoral e discernimento vocacional com a missão de dar a conhecer testemunhos reais e felizes de casais, de padres, de consagrados e de leigos; de promover workshops vocacionais; de dar a conhecer exemplos bíblicos de vocação e a vida dos santos e de encaminhar os jovens para as propostas diocesanas.
Alguns desafios concretos
Da leitura dos contributos recebidos para a elaboração deste plano pastoral, quer dos questionários, quer dos órgãos de corresponsabilidade da diocese, sublinham-se alguns desafios concretos para cada comunidade/unidade pastoral.
Que cada Paróquia/Unidade Pastoral:
- tenha um serviço de pastoral de juvenil organizado;
- tenha um serviço de pastoral e discernimento vocacional;
- tenha um Centro Juvenil como espaço de encontro, formação, oração, convívio;
- promova iniciativas de espiritualidade, como retiros, missões, jornadas de voluntariado;
- valorize grandes atividades como campos de férias, peregrinações, caminhadas;
- proporcione instrumentos para a pastoral juvenil como ‘Say Yes’, ‘Rise Up’, YouCat, Do Cat;
- dê especial atenção à preparação imediata para o Sacramento do Crisma, promovendo momentos de retiro, oração, voluntariado;
- proporcione aos jovens a participação numa ação concreta de primeiro anúncio, como Alpha jovem, Convívio Fraternos, ou outra experiência marcante para a vida cristã;
- celebre anualmente a Jornada Mundial da Juventude;
- invista na formação de animadores para a pastoral dos jovens;
- forme pessoas para acompanhar jovens no discernimento vocacional;
- assegure a integração de jovens nos órgãos de comunhão e de corresponsabilidade, como Equipa de Animação Pastoral, Conselho Pastoral, Conselho para os Assuntos Económicos.
Conclusão
Para dar frutos, o Plano Pastoral precisa de ser adaptado às circunstâncias de cada comunidade, que deve encontrar as estratégias e os meios para concretizar os objetivos e os dinamismos indicados.
Cada Paróquia/Unidade Pastoral tem necessidades e recursos diferentes que exigem respostas e caminhos também eles diferentes, que devem ser refletidos no âmbito do Conselho Pastoral e da Equipa de Animação Pastoral, envolvendo os catequistas, os ministros leigos e os próprios jovens. O Plano Pastoral não pode ficar centrado e ser assumido exclusivamente pelo Pároco, mas deve envolver todos os membros da comunidade.
Mesmo nas zonas mais despovoadas e com menos recursos não há justificação para que este Plano não tenha alguma concretização. Poderá não ser um trabalho de multidões, mas espera-se que seja feito com entusiasmo, com esperança e ajustado à realidade das comunidades.
Este Plano Pastoral surge em contexto de pandemia, mas está alimentado fortemente pela esperança que colocamos na radicalidade da nossa fé e na vivência cristã das nossas comunidades. A Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023 constitui uma oportunidade para estimular o nosso entusiasmo na evangelização dos jovens.
Abreviaturas
EG – Exortação Apostólica Evangelii Gaudium
FT – Carta encíclica Fratelli Tutti
ChV – Exortação Apostólica Pós-sinodal Christus Vivit
GE – Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate
LS – Carta encíclica Laudato Si’